Tio Macedo
O tio Macedo era quatro anos mais novo e uns cinco centímetros mais baixo que a tia Maria Adelina. Por causa da diferença de altura a tia Maria Adelina nunca usava saltos altos nem mises muito armadas. Não que ele lhe pedisse, que o tio Macedo não era pessoa para se ocupar dessas miudezas, mas a ela metera-se-lhe na ideia que os anos e os centímetros a menos davam a ideia que ela se vira aflita para arranjar um marido, que nem era mentira nenhuma, mas há coisas que não se precisam de saber.
O tio Macedo reformara-se antes dos sessenta, à conta de um joelho desfeito num acidente de trabalho, a qual era uma história um bocadinho mal contada dado que ele fora um manga de alpaca toda a vida. Era um homem de gostos simples, duas latinhas de atum com uma batatinha cozida eram o suficiente para o deixar feliz . Segundo dizia a filha mais velha era um grandessissímo reaccionário (com um azar sem explicação ao Vasco Gonçalves). Tirando isso não ligava grande coisa a política, preferindo outro tipo de programas de variedades, tanto na rádio como na televisão. Era um fiel seguidor do “Pão com Manteiga”, de tal modo que quando o Carlos Cruz começou com o “Um, dois, três”, as segundas à noite tornaram-se sagradas.
- Este gajo é um sádico, caramba! - comentava o tio Macedo, quando o Carlos Cruz trocava as voltas e fazia suspense com os concorrentes. Coitado do tio Macedo, sofria como se fosse com ele caso os concorrentes rejeitassem o objecto que dava o carro ou os electrodomésticos.
A fixação com o "Um, dois, três" era tão grande que mesmo tendo um carocha branco de 1978 e não bebendo leite, dizia ele que no seu tempo o leite era para as criancinhas e para quem já não tinha dentes, convenceu a tia Maria Adelina a comprar Cola Cao a cada duas semanas para ver ser lhes calhava o automóvel:
- Com dois rótulos de cada vez temos mais chances!
Coisa que obrigou a tia Maria Adelina a criar toda uma panóplia de receitas com Cola Cao, como o "molotof mulato" e a "mousse de chocolate um, dois , três".
O tio Macedo carregava algum desgosto pela falta de sorte das filhas, que a ele lhe parecia ser mais uma grande falta de juízo e, em acto de contrição, talvez a falta da rédea curta que ele não tinha sido capaz de lhes dar.
Sobre os genros dizia apenas:
- Cada tiro, cada melro.