Reflexo
No outro dia, olhei-me ao espelho e vi a minha mãe. Passava pelo corredor quando a vi reflectida num dos espelhos, por cima do aparador. As minhas rugas na testa são iguais às dela, arqueiam muito quando algo não é do nosso agrado. Passei-lhes as pontas dos dedos (que já as sinto com as pontas dos dedos). Quando eu era criança a minha mãe já era uma mulher no fim dos seus quarenta anos, principio dos seus cinquenta e eu tinha a certeza que iria demorar uma eternidade a chegar à idade dela. Era a mais velha de todas as mães da minha escola, uma vez perguntaram-me se era minha avó e eu fiquei triste por acharem a minha mãe tão velha. Esses 41 anos que nos separam nem sempre nos facilitaram a vida, especialmente durante a adolescência. Há uma grande incompreensão entre duas margens de tempo tão distantes.
Ficámos as duas frente-a-frente. A minha mãe será sempre mais bonita e eu tenho este torcer de boca irónico do meu pai. Mas estou muito parecida com ela, sim. Envelhecer é também tornarmo-nos numa espécie de reflexo dos nossos pais.